Sala de Estar

-Alec, isso é impossivel - disse Gillian como se eu fosse algum tipo de maluco. Cerrei o maxilar só pelo seu tom.
-Eu vi-a, ela é a fotocópia da Aurora. Um dia, vocês vão também vê-la, ela acabou de se mudar. - disse já de pé.
-E mesmo que fosse? Não podes fazer nada, não é a Aurora.
-Tu falaste com ela? - perguntou Dave por cima da voz de Gillian como se me estivesse a recreminar. Revirei os olhos passando as mãos pelo cabelo.
-Alec, tens que seguir em frente, é normal que depois de tantos an...
-Não, não, cala-te - falou Lia pela primeira vez - Eu estou a gostar, ele está a parecer... - parou como se estivesse à procura da palavra certa - vivo pela primeira vez em dois milénios. - Pensava que ela ia dizer alguma coisa de jeito, mas não, era Lia, ela nunca dizia nada de jeito. Fechei os olhos respirando fundo antes que cometesse alguma loucura.
-Sabem que mais? Vão-se..
-Tem cuidado com a língua, Alec - disse Gillian já à minha frente. Abanei a cabeça irritado e virei costas para ir dali embora.

Quando apareci em casa os meus irmãos ainda estavam lá a conversar uns com os outros, eles eram muito unidos, eu era tipo uma ovelha negra, tal como Lia, que como era um bocado para o chata era sempre renegada. Eles viraram-se todos para mim mal apareci. - Porque é que estás com esse ar todo divertido? - perguntou Gillian, nem sabia de qual das irmãs era a pior - voltaste a ter a tua alucinação? - cerrei o maxilar, agora irritado - não é uma alucinação - respirei fundo por não gostar de o fazer, mas agarrei-lhe na mão e mostrei-lhe o encontro que tinha tido com ela na praia, não gostava de o fazer, porque permitia que ela acedesse aos meus sentimentos, só o fazia porque ela não acreditava em mim e detestava que me desmentissem.
-Acreditas agora? - perguntei com um sorriso, voltando para o quarto deixando-a ainda mais pálida do que ela já era.

Mais um dia tinha passado e eu tinha tido uma ideia genial. Sorri para mim mesmo e acordei cedo para ir ao colégio. Vasculhei os ficheiros encontrando o nome do professor de história. O nome e não só, ele tinha a morada em baixo, com número de casa e tudo. Matei-o claro, mas tive um bocado de misericórdia da mulher, que coitada, estava com uma doença terminal. - Onde é que foste hoje? Levantaste-te cedo - olhei para Dave que me estava a olhar.
-Fui tomar o pequeno almoço - disse-lhe como se não fosse nada demais e ele apenas revirou os olhos e foi-se embora. Sorri agarrando na minha mala velha, onde pus uns livros e uns papéis que tinha roubado - vou sair, não esperem por mim. Pode ser que decida ir dar uma volta pelo mundo.

Quando voltei da escola para casa tinha de novo a recepção da minha querida família. Olhei-os com um sorriso e cruzei os braços ao peito - o que é que se passa? Agora sou um professor, preciso de preparar a matéria para amanhã - sorri pousando a pasta no sofá olhando-os depois mais sério - o que é que querem?
-O que é que queremos? Que pares de te armar em rebelde, não tens mais vinte anos, tens cem vezes mais do que isso - Falava Gillian. Sorri olhando para a lareira. - Pára de perseguir a miúda, ela não é a Aurora.
-Eu não estou a armar-me em rebelde Gillian, estou só a tentar não me aborrecer. - fechei os olhos e respirei fundo - porque se eu me aborreço... - abanei a cabeça - vocês sabem o que acontece. - Eu podia ser o mais velho, o mais evoluído, o que tinha mais capacidade e resistência à dor, mas no que tocava a sangue, não era mais um milénio que me ia deixar mais controlado. Quando se vivia tanto tempo, como a minha família e eu, havia sempre tempos aborrecidos e quando eles chegavam, eu ia apenas me divertia a alimentar-me.
-Mas ela é poderosa - disse Lia pela primeira vez do lado de Gillian o que me fez levantar uma sobrancelha - se ela é fisicamente parecida à Aurora e uma bruxa, não creio que venha só isso. Ela é igual a ela. - Ri-me com o que Lia disse.
-Eu sei. - vi-os olharem-me de sobrancelha levantada e apenas virei costas indo para o meu quarto.